Esse post foi motivado por uma discussão no Twitter. Vale como argumentação, já que fazer isso em 140 caracteres por vezes é impossível.
Sexta-feira estava eu no caminho para o Aeroporto de Congonhas, tipo 17h30 e aquela zona característica da Avenida Rubem Berta, um para-e-anda eterno. O taxista tinha a teoria para isso. “A culpa desse trânsito todo são os radares. Baixaram a velocidade para 60 km/h e por isso o trânsito fica ruim”. E eu fiquei pensando que o senso comum é culpar os radares, a CET (ou a BHTrans pra abraçar minhas duas realidades) ou os motoristas ruins, sem no entanto, olhar para o óbvio: Tem carro demais nas ruas.
Tem carro demais nas ruas. Afirmei isso no twitter e tomei pancada. Mas tem. Agora, quais são as razões pra isso? A principal e, a qual acredito devemos cobrar mais, é a falta de investimentos em transporte coletivo e alternativo. Me parece uma matemática simples: Com transporte ruim e desconfortável, o caminho natural das pessoas é escolher o carro, mesmo que o ganho de tempo seja mínimo, se é que exista. Já falei isso algumas vezes, não canso de repetir: Quando o transporte público for mais eficiente, confortável e prioritário em relação ao carro, ele será escolhido como modal principal.
Outra razão é cultural (ou midiática). Carro é status. Ter carro é legal, traz poder, é sinônimo de independência. De vez em quando, a troca do carro entra antes da reforma da casa. Carro, Carro, Carro! É um assunto que merece ser estudado a fundo, penso. E vejam, não estou demonizando o coitado. Algumas pessoas precisam diariamente. Eu, felizmente, preciso eventualmente e quase que somente em Belo Horizonte.
E toda essa argumentação e defesa acima também serve para as bicicletas. É preciso criar estrutura cicloviária para que as pessoas percam o medo de pedalar nas ruas. Incentivar a construção de ciclofaixas (são mais educativas), concientização para grande parte de motoristas e motoqueiros e, quando possível, suporte ao trabalhador que usa a bicicleta rotineiramente: chuveiro, local para guardar a magrela em segurança etc.
Em Belo Horizonte, eu ia e voltava de bicicleta do trabalho porque era mais rápido. Quando mudei de emprego, passei a ir somente uma vez por semana, por falta de estrutura no prédio onde trabalhava. Aqui em São Paulo atualmente utilizo o ônibus. Mas morro de raiva em ver a quantidade de gente espremida dentro. E isso serve para o metrô também. Imagina então o ódio do cara que vai espremido de Itaquera até Jabaquara. Esse sujeito deve pensar “quando tiver dinheiro, vou comprar um carro e foda-se pra isso tudo aqui”. É a solução mais simples, na cabeça dele.
Então, quando acho que a proporção de duas pessoas por carro significa muita coisa não é pra menos. Ok, Chico me alertou que em Berlim a proporção é quase 1/1. Ok. Certa vez li uma matéria sobre Vauban, cidadezinha também alemã que tem proporção semelhante, mas o transporte coletivo é tão eficiente e a cultura da bicicleta tão viva, que as pessoas deixam os carros em casa e só andam quando necessário. É nesse ponto que eu quero chegar. São Paulo (e BH, Rio, Brasília) poderiam ser Vaubans em maior escala.
Utópico. 😉
Fernando Norte
Boa Cabeça,
Só um comentário sobre você dizer que “carro é status”. Eu antigamente achava isso também, mas vejo que hoje não é mais não. “Status” é o carrão de luxo, grande e alto. Carro já banalizou e facilitou para todos.
Comprar um carro a primeira vista é acessível a qualquer um que tenha R$350 no orçamento para abrir um financiamento por 5 anos, sem pensar no depois o quanto ele vai consumir com gasolina, estacionamento, oficina, iptu, seguro e mais um tanto de coisa que vão deixar de pagar ou burlar no melhor estilo Gerson.
O caminho medíocre é sempre mais fácil. O ônibus está demorando e é lento, porque tem muito carro na rua, e se eu estou parado no ponto para pegar um ônibus cheio e lento enquanto as outras pessoas estão confortáveis no seus carros com ar condicionado e ouvindo música, cantando junto e tirando meleca do nariz, eu deveria fazer o mesmo. É mais confortável sofrer no trânsito assim do que em pé num ônibus lotado e ‘saculejento’.
Quem sabe no dia que o contrário acontecer, quando você ficar parado no trânsito dentro do seu carro enquanto vê muitos ônibus passando rápidos e sem pessoas sem espremendo a mediocridade siga seu rumo e as pessoas mudem para a opção coletiva ao invés da individual.
Diogo Freire
Daniella
Engraçado ler isso justo hoje. “Tem carro demais nas ruas” saiu quando me deparei com um trânsito ruim em horário alternativo. Concordo com o que disse, mas ainda mais, Felipe, tenho me espantado como aqueles que não dirigem tem tido cada vez menos respeito. (sou uma não-motorista desde que decidi não mais enfrentar meu pânico de direção)
Esses dias, atravessando na faixa de pedestres, o semáforo mudou e eu, no meio do percurso, me vi obrigada a correr porque carros e motos me intimidaram, buzinando e ameaçando seguir adiante. Eu estava no meio da faixa quando as luzes mudaram, eles deveriam me esperar. Ainda ouvi desaforo. Mas os motoristas de carro aqui ainda tem o “poder”, além de tudo isso que vc listou.
O carro polui, faz barulho, causa tráfego, etc etc etc e é preferido; a mim, ‘andante’ que sou, silenciosa, inofensiva, e que saudavelmente se exercita, cabe o medo de atravessar ruas – na faixa e sinal verde de pedestres.
Abs!